DE PAULO PARA TIMÓTEO: MINISTÉRIO PASTORAL, LIDERANÇA E SERVIÇO – Segunda Parte (por Rev. Flávio  Américo)
Lois, Eunice and Timothy, por William James Webbe, cerca de 1885.

A quarta lição (as primeiras três lições podem ser lidas aqui) que destaco das cartas pastorais paulinas a Timóteo é que os crentes devem orar por seus governantes civis (1Tm 2.1-3). A questão da relação entre cristão, Igreja e Estado tem sido debate desde o Novo Testamento. Hoje, no Brasil, esse é um tema de muito debate e polarização. Um dos principais pontos de debate é o grau de interferência do Estado na vida dos cidadãos. 

Essa discussão foge ao escopo desse trabalho, mas é possível, baseado na leitura da primeira carta de Paulo a Timóteo (ou seja, sem levar em conta outras passagens bíblicas, inclusive paulinas), afirmar que todos os crentes devem ter uma vida de oração por seus governantes e devem buscar viver de forma ordeira em sociedade. Resumindo, a visão isolacionista de certos grupos anabatistas e do monasticismo católico não é condicente com a visão bíblica. Também estão equivocadas posturas que confundem as esferas de atuação da igreja e do Estado, gerando interferências mútuas, algo fora dos padrões bíblicos e que geraram e geram, ainda hoje, malefícios para a propagação do Evangelho.

A quinta lição é que todo presbítero é um pastor e deve, portanto, ensinar as Escrituras ao povo de Deus. A diferença entre presbíteros e diáconos é, essencialmente, a questão do ensino, essa é a única atribuição que diferencia um ofício do outro (1Tm 3.2; Tt 1.5). Mas não tem sido assim na prática de muitas igrejas presbiterianas, inclusive na Igreja Presbiteriana do Brasil. Muitos conselhos são formados por presbíteros que foram eleitos (e/ou se vêem) como administradores, não como pastores que devem ensinar a sã doutrina aos crentes. 

Não é suficiente dizer que ele ensina com a vida. Paulo é claro quando diz que o presbítero deve ter didática, ou seja, deve ser apto a ensinar a sã doutrina (assunto muito importante nas cartas pastorais), uma vez que a raiz grega para “ensino” (palavras como “ensinar”, “ensino” e “mestre” estão entre elas) aparece um pouco mais de 20 vezes nas duas cartas, evidenciando a importância da transmissão do ensino apostólico. Não é que todo presbítero deva ser um exímio orador, mas ele deve ser capaz de ensinar sobre a “fé que uma vez por todas foi entregue aos santos” (Jd 3), mesmo que seja em pequenos grupos ou em um discipulado pessoal. 

Na prática, acaba preponderando na igreja atual uma visão de três ofícios: diáconos, que cuidam da ordem do culto e dos necessitados; presbíteros, que são entendidos como uma espécie de acionistas da igreja, no máximo gerentes de ministérios da comunidade; e pastores, não vistos como presbíteros mais dedicados ao ensino, mas como fazedores de tudo que a igreja precisa, afinal, são vistos como funcionários por serem pagos pelo trabalho. 

É urgente, inclusive para que toda a igreja local seja ensinada na sã doutrina, que a compreensão presbiteriana de dois ofícios (diáconos e presbíteros) seja retomada. É preciso entender que, embora o ofício do presbiterato seja dividido em duas funções (ensino e regência/governo), os dois tipos de presbíteros devem atuar juntos no pastoreio, ensino, governo e disciplina do rebanho a eles confiados (At 20.28), sendo a diferença apenas o tempo maior de dedicação. 

A sexta lição é que boa Teologia gera adoração a Deus. Não é uma peculiaridade das cartas supracitadas expressões exaltadas de adoração a Deus no meio de textos dissertativos (Rm 9.5; 11.36; 16.27; Gl 1.5; Fp 4.20; Ef 3.21; 1Tm1.17; 2Tm 4.18). Diante da imensidão da misericórdia e da fidelidade de Deus, Paulo costuma irromper em doxologia. 

Nos nossos dias, existe a falsa idéia de que preocupação com a sã doutrina implica em uma fé morta, sem alegria e sem louvor. Parece que as pessoas têm que escolher entre uma igreja com adoração vibrante (aqui entendida como uma comunidade de pessoas com corações cheios de gratidão pelo que Jesus fez por elas na Cruz e pela vitória do Cristo na Ressurreição, gratidão essa exposta em cultos solenes e alegres e em vidas santas) e uma igreja com ensino bíblico-doutrinário. Teologia ruim pode degenerar tanto uma comunidade a ponto da adoração ao Deus vivo ser deixada de lado e passar-se a adorar ídolos. 

A prática paulina de unir ensino sobre quem Deus é e sobre o que Ele fez por nós em Cristo (a sã doutrina não trata disso?) com verdadeiros tesouros poéticos de adoração mostra que sã doutrina e adoração não apenas não se excluem entre si, mas estão intimamente ligadas, sendo a segunda decorrente da primeira. Boa Teologia, conhecimento da sã doutrina, cria nos crentes gratidão profunda e contagiante por tudo que Nosso Senhor e Salvador fez por nós. Sendo assim, irmãs e irmãos, declaremos, juntamente com o Apóstolo dos Gentios, que, “ao Rei eterno, imortal, invisível, Deus único, honra e glória pelos séculos dos séculos. Amém!” (1Tm 1.17).


A TERCEIRA (E ÚLTIMA PARTE) SERÁ PUBLICADA SEMANA QUE VEM!

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