Observemos a TV: vários canais trazem programas religiosos que falam de Jesus, de Deus e da Bíblia. Inclusive um dos maiores canais abertos do país pertence a uma denominação Neopentecostal, cujo slogan é “Jesus Cristo é o Senhor”, mesmo que, nessa igreja, o Messias, frequentemente e de forma enganosa, receba ordens. Esse teor de manipulação da divindade está presente em muitos outros canais e programas televisivos.
Vamos dar uma volta agora na cidade. São inúmeras as denominações evangélicas e neopentecostais, algumas com nomes extremamente curiosos, tais como: Igreja do Senhor Jesus Cristo: Ele Vem, Eu Vou e Tu Ficas; Igreja do Cuspe Santo de Cristo; Igreja Pentecostal a Cobra de Moisés Engoliu as Outras; Assembleia de Deus Pavio que Fumega… e por aí vai!
Em uma conversa rápida no mercado, poderemos ouvir expressões como “está amarrado”, “misericórdia”, “se Deus quiser”, “que Deus abençoe” e várias outras expressões típicas dos crentes. Alguém que desconhecesse completamente o Brasil e caísse de pára-quedas aqui julgaria que está em um lugar em que Cristo é o ser mais relevante da vida das pessoas e cuja soberania é respeitada, isto é, um país em que Cristo é o Senhor. Nada mais distante da realidade.
Embora o Brasil seja um país com fortes raízes cristãs católicas e fortemente influenciado, nas últimas décadas, pelo movimento evangélico e neopentecostal, continua sendo um país marcadamente contaminado por pecados nas áreas da ética, da política, da moral, da economia, da preservação ambiental etc.
Somos uma nação em que Jesus está em nosso linguajar, nas nossas televisões, na internet (vide inúmeros sites e grupos de redes sociais sobre religião) e até nos nossos domingos, mas é um Jesus que parece ter pouco a nos dizer no nosso dia-a-dia e nos momentos nos quais tomamos decisões. Infelizmente, não é só o Brasil cristianizado que dá pouca atenção ao que nosso Senhor ensinou. A igreja brasileira também tem deixado de viver o pleno Senhorio de Cristo em sua vida, fazendo com que sejamos como sal sem gosto ou luz debaixo de vasilha (Mt 5:13-16 e Lc 14:34-35 e 11:33).
Concordo com John Stott (Jesús es el Señor, 2011; O Discípulo Radical, 2011) e Dionísio Pape (Cristo é o Senhor, 2003) quanto ao fato de que a Igreja precisa urgentemente sujeitar suas escolhas e sua ética à vontade de Cristo. Quando isso acontecer, a relação do cristão com Deus; consigo mesmo; com o próximo na relação indivíduo-indivíduo; com o próximo na relação com a sociedade; com a cultura e com o meio-ambiente serão transformadas. A espiritualidade cristã deixará de ser algo meramente introspectivo, intimista, para ser algo mais relacional, embora mantendo ainda seu caráter interior.
É imperativo que vivamos tendo em mente que Jesus nos salvou e o fez com precioso sangue. A graça é, usando a expressão de Dietrich Bonhoeffer, preciosa. Devemos, então, fugir da graça barata: “A graça barata é a pregação do perdão sem arrependimento, é o batismo sem a disciplina comunitária, é a Ceia do Senhor sem confissão dos pecados, […] a graça barata é a graça sem discipulado, a graça sem a cruz, a graça sem Jesus Cristo vivo, encarnado”. (Discipulado, 2004). O próprio Senhor Jesus Cristo faz a pergunta que não quer calar: “por que me chamais Senhor, Senhor, e não fazeis o que vos mando?” (Lc 6:46).
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